(…) E o constrangimento social, o véu de
desconforto que frequentemente cerca a esfera da
morte em nossos dias é de pouca ajuda.
Talvez devêssemos falar mais aberta e
claramente sobre a morte,
mesmo que seja deixando de apresentá-la
como um mistério. A morte não tem segredos.
Não abre portas. O que sobrevive é o que ela ou
ele deram as outras pessoas,
o que permanece nas memórias alheias.
Norbert Elias, A solidão dos moribundos, 1982
As manifestações sobre a morte e outras derivadas dos estados fúnebres – luto, dor, tristeza e sofrimento – são instâncias representativas distintas e indissociáveis no desenho da paisagem. Elas vigoram na cidade desde o seu surgimento, e produzem atmosferas inequívocas no cotidiano do tecido social e urbano. Suas dimensões, em suas múltiplas complexidades físicas e metafísicas, colocam em evidência a inconformidade com a finitude da vida, sobretudo, quando a desolação da morte se instala no ser humano. Há de se pensar também que, em movimento inverso, elas guardam em si o vigor da inventividade, da pluralidade do gênio humano ao criarem ambiências e artefatos que, na sua essência, produzem espaços, fabricam objetos e criam lugares. Nessas instâncias físicas, surgem inúmeras simbologias que, entre outras coisas, estabelecem elos de memórias, fomentam sacralidades, aguçam a celebrações, evocam a honra, o reconhecimento ou mesmo a repulsa por vidas que já se foram.
Ao considerar o tecido urbano contemporâneo a partir dos domínios que representam o fim da vida, o binômio morte e estados fúnebres potencializa a construção de ambientes e artefatos, nos quais o vácuo deflagrado pela morte, traduzido pela dissolução do corpo e a consequente ausência entre os vivos, é materializado nas paisagens e, em diferentes ordens e sentidos ganha forma, conteúdo e confere movimento à cidade. Tal perspectiva, interposta à construção de paisagens interpretadas por essa reflexão como fúnebres, consubstanciam-se em espaços onde o inanimado, o silêncio, o desaparecimento, o sombrio, o esquecimento e o fantasmagórico ganham potência e proeminência no desenho da arquitetura de lugares como cemitérios, Monumentos in memorian, necrotérios; ambientes esses onde manifestações de contrição, pesar, desolação e repulsa estão presentes e revelam limites bem definidos aos vivos, quando a questão se refere ao fim da existência do outro e da sua própria.
A cidade contemporânea continuará a conviver com a morte e esse é um fato concreto e irrefutável. Contudo, a sociedade parece restringir a morte – ou qualquer representação que esteja atrelada a ela – a locais sagrados ou dedicados a ritos cerimoniais. Todavia, a morte se mostra presente em hábitos urbanos, de modo sutil ou espetacular, através de diálogos silenciosos de enlutados que velam seus defuntos em igrejas, capelas cemiteriais ou, nos meios de comunicação que, através do cyberespaço, ou amplificados pelas redes sociais e sites de notícias compartilham informações de catástrofes, acidentes fatais, atentados terroristas. Essa miríade de dados e informações por um outro lado, mitigam na população o processo da morte e do desaparecimento de ícones religiosos, celebridades, ou, mesmo, de assassinos ou terroristas que instigam o imaginário alheio.
Nessa ordem de fatos e narrativas, a proposta do Curso Artes visuais e arquitetura de paisagens fúnebres apresentará as fronteiras que, historicamente, a sociedade traçou para se relacionar com seus mortos, no interesse de entender as dimensões simbólicas de como a morte e o morrer, quando representados pelas artes visuais, são interpretados pelo corpo social na cidade em movimento. Diante disso, a produção da cultura material e seus artefatos, os ritos e dogmas religiosos, em especial as obras de arte e tudo aquilo que ganha visualidade na paisagem, tornam-se elementos essenciais para serem analisados e colocados em perspectiva ao longo dos seis encontros.
Rubens de Andrade
Cronograma de Aulas
DATA | RECORTES TEMÁTICOS | |
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24.OUT | A paisagem sob o signo da tanatologia Prof. Rubens de Andrade |
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31.OUT, | Onde a morte habita: cemitérios e monumentos In memorian Prof. Rubens de Andrade |
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14.NOV | Ritos funerários, dogmas religiosos e representações artísticas da finitude humana na cidade Prof. Aldones Nino |
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21.NOV | Ausências, luto e necropolíticas: narrativas sobre morte e o morrer na Arte Contemporânea Prof. Aldones Nino |
Formulário de Inscrição
Inscrições
Profissionais | R$ 280,00
Pós-graduandos e professores da Rede Pública| R$ 220,00
Graduandos | R$ 150,00
Local | Horário
Museu da República | Rua do Catete, 157, Catete, Rio de Janeiro - RJ
Sala de Cursos ( Térreo)
Quintas-feiras | Horário: 19h00-21:30
Professores
RUBENS DE ANDRADE Professor Adjunto da Escola de Belas Artes-EBA-UFRJ (Curso de História da Arte/Paisagismo), Doutor em Planejamento Urbano e Regional (IPPUR-UFRJ), Mestre em Arquitetura (PROARQ-FAU/UFRJ), Paisagista (EBA/UFRJ), Líder do Grupo de Pesquisas Paisagens Híbridas (GPPH-EBA-UFRJ) e Pesquisador vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Arquitetura (PROARQ-FAU/UFRJ). |
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ALDONES NINO Doutorando em Historia y Arte pela Escuela Internacional de Posgrado de la Universidad de Granada em Co-tutela com o Programa de Pós Graduação em Artes Visuais da Escola de Belas Artes da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Mestre pelo Programa de Pós-Graduação em História, Política e Bens Culturais (PPHPBC) pelo Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil (CPDOC) da Escola de Ciências Sociais da Fundação Getúlio Vargas. Bacharel em História da Arte pela Escola de Belas Artes - Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Bacharel e Licenciado em Filosofia pela Universidade São Judas Tadeu, USJT-São Paulo. |
Referências
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BAUMAN, Zygmunt. Confiança e medo na cidade. Rio de Janeiro: Zahar, 2009.
BOBBIO. Norberto. Elogio da serenidade e outros escritos morais. São Paulo: Unesp, 2011
ELIAS, Norbert. A solidão dos moribundos. Rio de Janeiro: Zahar, 2011.
FERREIRA, J. M. Simões. Arquitectura para a morte – a questão cemiterial e seus reflexos na teoria da arquitetura. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2009.
HUIZINGA, Johan. O outono na idade média. São Paulo: Cosac naify, 2011.
KULKA, Otto Dov. Paisagens da metropole da morte – reflexões sobre a memória e a imaginação. São Paulo: Cia das Letras, 2014.
LAUWERS, Michel. O nascimento do Cemitério. São Paulo: Unicamp, 2015.
LAVELLE, Louis. O mal e o sofrimento. São Paulo: É Realizações, 2014.
POE, Edgar. Contos de imaginação e mistério. São Paulo: Tordesilhas, 2012.
RODRIGUES, José Carlos. Tabu da morte. Rio de Janeiro: FIOCRUZ, 2011.
SARAMAGO, José. As intermitências da morte. São Paulo: Cia das letras.
SCHOPENHAUER, Arthur. Sobre a morte: pensamentos e conclusões sobre as últimas coisas. São Paulo: Martins Fontes, 2013.
SÊNECA. Sobre a brevidade da vida. São Paulo: L&PM,
TUAN, Yi-Fi. Paisagens do Medo. São Paulo: Unesp, 2005.
VAZ, Lucio. A simulação da morte. São Paulo: Perspectiva, 2011.
VOVELLE, Michel. As almas do purgatório ou o trabalho de luto. São Paulo: Unesp, 2011.
Realização | Organização | Parceiros | Apoios
Professor Associado da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Docente da Escola de Belas Artes (História da Arte e Paisagismo) e do Programa de Pós-Graduação em Arquitetura – ProArq/UFRJ, Paisagista (EBA/UFRJ), Mestre em Arquitetura (ProArq –FAU/UFRJ) e Doutor em Planejamento Urbano e Regional pelo (Programa de Pós-Graduação de Planejamento Urbano e Regional-IPPUR/UFRJ). Líder no CNPq do Grupo de Pesquisas Paisagens Híbridas – GPPH-EBA/UFRJ.
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