PROARQ-FAU/UFRJ – Domínios da paisagem/23

FAT 727/827 – Domínios da paisagem (45h)
4º Trimestre: 28 de setembro de 2023 a 21 de dezembro de 2022
Quinta-feira | Horário: 09:30 – 13:30
Prof. Rubens Andrade

O CURSO

Tendo como recorte temático os estudos da  Paisagem, o curso percorrerá os fundamentos teóricos e conceituais para interpretar as relações-representações socioespaciais e suas implicações no tecido urbano. Para tanto, matrizes analíticas de diferentes ordens relativas ao ambiente construído serão formuladas no interesse de produzir diálogos que aproxime diferentes perspectivas teóricas e singularize perspectivas conceituais postuladas pelo campo disciplinar da paisagem, em especial temas voltados ao debate socioambiental, a produção de visualidades que se manisfestam na cidade, como também, pensar o movimentos orgânicos, artificiais e ciberculturais e a formação de novos territórios, .

Ao longo do curso será colocado em discussão as teorias da paisagem a partir de autores das Escolas francesa, anglo-saxão e brasileira, alinhando a discussão a uma perspectiva histórica e transcultural, seja sob o ponto de vista do hibridismo cultural como também, pelo exame das espacialidades reveladas a partir de práticas socioculturais.

A complexa teia de hibridismos culturais que se desvelam na construção da urbanidade das cidades seja a partir do final do século XIX e estendido até os dias de hoje, sera destacada a partir da análise do tecido urbano que cada vez mais fabrica jogos de imagens, representações e usos que não consideram apenas o legado morfológico e tipológico existente na trama urbana, mas efetivamente, potencializam plurais arranjos urbano-paisagísticos em diferenciados níveis de apropriação pelos atores sociais assim como pelos não-humanos e objetos inanimados que atravessam e constituem os ambientes da cidade .

O estudo da História da Cidade,  a análise iconográfica, as leituras da História da Arte, serão os elos para as abordagens estabelecidas ao longo do curso. Nesse processo é mister perceber as camadas que constituem as paisagens urbanas em diferentes tempos históricos por meio de linguagens formais e simbólicas que desenham cidades, criam ambientes e definem culturalmente a ideia de lugar.

Diante de tais objetivos, a disciplina desenha sua trajetória em análises que se abrem para interpretações transdisciplinares. Desse modo, a mesma percorrerá territórios de saberes distintos, mas simultaneamente, atravessará fronteiras disciplinares cujo intuito é estabelecer um pensar teórico amplo, condizente com a perspectiva contemporânea que busca analisar a história da sociedade, das cidades e de suas paisagens nos dias atuais.

JUSTIFICATIVA

A experiência estética da paisagem é uma experiência política, e explorar as partes que a compõem, suas características e suas relações, sua diversidade de formas, usos e sentidos, e procurar juízos que deem conta dos mecanismos de realização e desrealização é um percurso acidentado que pode nos remeter a uma (re)apropriação política da paisagem. Produto humano, fato da cultura, a paisagem traz impressa em tudo que a constitui as pautas, os rituais e os significados simbólicos da sociedade que a produziu – traz em si, portanto, forte componente ideológico, que pode ser analisado a partir de sua formulação, como também na apropriação pela sociedade. A partir de uma perspectiva que assume um caráter político e sociocultural, e fundamentado pelos rigores das teorias e conceitos do campo de estudo da arquitetura da paisagem, desenha-se o pano de fundo reflexivo que será o fio condutor, definido para discutir a dimensão e o papel dos estudos da paisagem como matriz conceitual que tem o vigor de interpretar as relações entre cultura e natureza no ambiente construído.

O recorte temático e o objeto da disciplina voltam-se para um campo discursivo fértil que revela desafios teóricos a serem superados a partir de uma compreensão crítica tanto das práticas socioespacias quanto das hibridizações culturais que resguardam os estudos da paisagem em seu campo ampliado, assim como os conceitos que definem as bases do estudo da arquitetura da paisagem stricto sensu. A escolha da arquitetura da paisagem como objeto da disciplina aponta para um conceito, mas também para um instrumental metodológico cuja contextualização crítica solicita o estabelecimento de critérios, quer sejam eles associativos ou comparativos, que articulem objetos, ações e questões, sob o prisma de domínios históricos, sociológicos, morfológicos e paisagísticos, nos quais os conceitos de cidade e campo, espaço e lugar, sociedade e natureza, arte e ambiente estabelecem-se como elementos essenciais para o entendimento do recorte temático da disciplina: os estudos da paisagem e de seus hibridismos culturais e conflito socioespaciais.

O ponto de partida da discussão e o recorte epistemológico propostos pela disciplina optam pelo campo disciplinar da Arquitetura e Urbanismo e seus atributos, alusivos à técnica, à arte e aos métodos de organização do espaço e da construção do lugar. Por um outro lado, a argumentação apoia-se no arcabouço teórico tributário aos estudos urbano-paisagísticos, que, em particular, firma-se nas últimas décadas como área de excelência disciplinar e de conhecimento.

Tais argumentações provenientes desses dois campos de saberes distintos e complementares transitarão pelos aportes teóricos relativos às ideias da invenção da paisagem e cultura paisagística pois seusfundamentos instauram uma compreensão dialética que confere o sentido e a possibilidade de diferentes interpretações urbano-paisagísticas como matriz conceitual e elemento problematizador que se auto-defina, e a arquitetura da paisagem como território teórico que o abriga e possibilita seu trânsito e expansão através do arco dos estudos contemporâneos. O confronto entre esses pensares pode revelar caminhos para a crítica de arranjos interpretativos a partir de padrões, símbolos e signos que se manifestam nas práticas socioespaciais e na morfologia do tecido urbano afinal, ambos se revelam através da história da paisagem, e, propriamente, na materialidade dos ambientes construídos. 

O efeito que se quer gerar com tal movimento não é a subversão ingênua ou a banalização de conceitos, levando o contraditório ao seu limite – este não é o argumento estruturante da questão. A ideia é justamente o oposto, ao sinalizar, entre outras coisas, (i) a rejeição de um aparelhamento sistêmico que reproduz conceitos; (ii) a consequente desnaturalização teórica de conceitos aplicados até a sua exaustão, e, por fim; (iii) a crítica à mecanização de práticas analíticas da paisagem (auto-referenciadas) que carregam o estandarte de uma opaca rotina metodológica que em tese, reescreve ideários, repete jargões, valida dogmas e, por isso, institui outros,  e assim congela um debate que, por natureza, está sob o signo da anamorfose e pulsa através da reivindicação feita pelas forças produtivas avant garde. O que está em pauta é o interesse de aprofundar o estudo de hibridismos culturais e práticas socioespaciais, mediante a reflexão teórica e a elaboração de um escopo conceitual que acolha a discussão de matérias pertinentes ao recorte temático e ao objeto definido da pesquisa: os domínios da paisagem.

CRONOGRAMA DE SESSÕES DE AULA

Sessão de AulaDiaRecortes Temáticos
28SETa) Apresentação da disciplina
B) Metodologia de Abordagens
c) Conteúdo programático
D) Proposta de trabalho final
05OUTEpistemologia dos estudos da paisagem I: arcabouços teóricos e enclaves metodológicos
DARDEL, Eric. O homem e a terra: natureza da realidade geográfica. São Paulo: Perspectiva, 2015 (p. 1-45).

BESSE, J. Marc. O gosto do mundo: exercícios de paisagem. Rio de Janeiro: UERJ. 2014. [As cinco portas do conhecimento – ensaio de uma cartografia das problemáticas paisagísticas contemporâneas, p. 33-61].

Texto complementar
GARDIES, André. A paisagem como momento narrativo In: Revista NOZ. Revista de Arquitetura. no. 3, 2007. PUC-RIO. (p. 48-59)
Acesso: https://issuu.com/revistanoz/docs/noz3
19OUTEpistemologia dos estudos da paisagem II: histórias de lugares e a construção de cotidianos
THOMAS, Keith. O homem e o mundo natural. São Paulo: Cia de Bolso, 2010. [O dilema humano, p. 343-428].

SCHAMA, Simon. Paisagem e memória. São Paulo: Cia das Letras, 2009. [Arcadia redesenhada, p. 513-573].

Texto complementar
FREYRE, Gilberto. Ordem e Progresso. São Paulo: Record, 2009. [A República de 89: o desafio do trópico à civilização brasileita, p. 857-873].
26OUTEpistemologia dos estudos da paisagem III: quadrantes do mundo natural: pensar os recursos naturais, a ordem ecológica e a crônica sobre a poésis do jardim.
DIEGUES, Antonio Carlos Sant'Ana. O mito moderno da natureza intocada. São Paulo: HUCITEC, 1996.[O surgimento do movimento para a criação de áreas naturais protegidas nos estados unidos e suas bases ideológica, p. 23-34; Da crítica à exportação do modelo de parques nacionais norte-americanos , p. 35-38; Escolas atuais de pensamento ecológico e a questão das áreas protegidas, p. 39-52; Escolas atuais de pensamento ecológico e a questão das áreas protegidas , p. 53-62; As representações do mundo natural, o espaço público, o espaço dos "comunitários" e o saber tradicional, p. 63-74].

CAUQUELIN, Anne. A invenção da paisagem. São Paulo: Martins Fontes, 2000. [Um jardim tão perfeito, p. 17-32; As formas de uma gênese, p. 33-42].

Texto complementar
WOLF, Virgínia. Brevidade da vida. Belo Horizonte: Autêntica, 2017. [Kew Gardens, p. 99-122].
16NOVEpistemologia dos estudos da paisagem IV: o mal-estar na cidade e os signos da finitude humana
LEBRETON, David. Antropologia da dor. São Paulo: Unesp, 2013. [Introdução ( p.13-23), I. Experiência da dor (p. 25-45)].

TUAN, Yi-Fu. Paisagens do medo. São Paulo: Unesp, 2005. [Medo da natureza humana: fantasmas, p. 179-208].

Texto complementar
DAVIS, Mike. Cidades mortas. São Paulo: Record, 2007. [Memórias do Tsunami, p. 131-142].
30NOVSEMINÁRIO I | Paisagem e hibridismos culturais I: ordem política-ambiental e seus reflexos no tecido urbano

Coletivo
Lígia Castanheira Magalhães | Victor Assi Belfort Bastos
GUDYNAS, Eduardo. Direitos da natureza - ética biocêntrica e políticas ambientais. Sâo Paulo: Elefante, 2019. [Os valores da natureza, p. 15-39; Conservação: ética, ciência e crise, p. 271-292].

DUFOUR, Dany-Robert. A arte de reduzir cabeçasÇ sobre a nova servidão na sociedade ultraliberal. São Paulo: Companhia de Freud, 2005. [O neoliberalismo: a dessimbolização, uma forma de dominação inédita, p. 189-2010.
07NOVSEMINÁRIO II | Paisagem e hibridismos culturais II: estratégias e interações corpo-cidade

Coletivo
Nátaly Santos | Sergio Henriques
BABHA, Homi K. O local da Cultura. Belo Horizonte: UFMG. [DissemiNação: o tempo, a narrativa e as margens da nação moderna, p. 227-273)].

MBEMBE, Achille. Necropolítica: biopoder, soberania, estado de exceção, política da morte, Rio de Janeiro: N-1. 2018, p. 5-37.
14DEZSEMINÁRIO III | Práticas socioespacias: Paisagem-jardins – arcádias contemporâneas I

Coletivo
Gabriel Martucci | Lia Bizzo
SAYRE, Robert; Löwy. Michael. Anticaptalismo romântico e natureza: O jardim encantado. São Paulo: UNESP, 2021. [Raimond Williams: cultura romântica e ecológica socialista, p. 135- 159].

STENGERS, Isabele. No tempo das Catastrofes. São paulo: Cosac Naify p. 27-61.

21DEZSEMINÁRIO IV | Práticas socioespacias: Paisagem-jardins – arcádias contemporâneas II

Coletivo:
Lia Bahia | Julia Beatriz | Sofia Tairol
ACOSTA, Alberto. O bem viver: uma oportunidade para imaginar outros mundos. São Paulo: Elefante, 2016.[O bem viver e os direitos da natureza, p. 101- 140].

CHUL HAN, Byung. Louvor à terra: uma viagem ao jardim. Petrópolis: Vozes, p. 9 - 49.

REFERÊNCIAS

BESSE, Jean-Marc. O gosto do mundo: exercícios de paisagem. Rio de Janeiro: Eduerj, 2014.

BURKE, Peter. Testemunha Ocular: história e imagem. São Paulo: Edusc, 2004. 

CAUQUELIN, Anne. A invenção da paisagem. São Paulo: Martins Fontes, 2000.

COLLOT, Michel. Filosofia da paisagem. Rio de Janeiro: Oficina Raquel, 2013.

DAVIS, Mike. Cidades mortas. Record, 2007.

DIEGUES, Antonio Carlos Sant’Ana. O mito moderno da natureza intocada. São Paulo: HUCITEC, 1996.

DONADIEU, Pierre. La sociedade paisajista. La Plata: Eudulp, 2006.

FELICE, Mássimo di. Paisagens pós-urbanas: o fim da experiência urbana e as formas comunicativas do habitar. São Paulo: Annablume: 2009.

GUATTARI, Felix. As três ecologias. São Paulo: Papirus, 2012.

GUDYNAS, Eduardo. Direitos da natureza:ética biocêntrica e políticas ambientais. Sâo Paulo: Elefante, 2019

HAAS, José Antônio Aldrete. La nueva Arcádia. Ciudade do México: Textofilia, 2018.

HAN, Byung-Chul. Hiperculturalidade: cultura e globalização. Petrópolis: Vozes, 2019

______. Capitalismo e impulso de morte: ensaios e entrevistas. Petrópolis: Vozes, 2021.

MOSTAFAVI, Mohsen; DOHERTY, Gareth. Urbanismo ecológico. São Paulo: Gustave Gilli, 2014.

SANTAELLA, Lucia. Culturas e artes do pós-humano: da cibercultura da midias à cibercultura. Sâo Paulo: Paulus, 2003. 

SANTOS, Milton. A natureza do espaço. São Paulo: Edusp, 2009.

SCHAMA, Simon. Paisagem e memória. São Paulo: Cia das Letras, 2009.

TERRA, Carlos; ANDRADE, Rubens. Paisagens culturais: contrastes Sul-Americanos. Rio de Janeiro: EBA Publicações, 2008.

THOMAS, Keith. O homem e o mundo natural. São Paulo: Cia de Bolso, 2010.

TUAN, Yi-Fi. Paisagens do medo. São Paulo: Unesp, 2005.

WAGNER, Roy. A invenção da cultura. Cosac Naify, 2010.

WOOLF, Virgínia. A arte da brevidade. São Paulo: Autêntica, 2017.

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