Tópico Especial – PAISAGENS FÚNEBRES

Escola de Belas Artes | Centro de Letras Artes – EBA-CLA/UFRJ
Curso de História da Arte
Tópico Especial Arte e cidade: paisagens fúnebres | Código: 15100
Quinta-feira: 13h00 – 16h00

É porque ela não repousa sobre nada, porque carece até
mesmo da sombra de um argumento que perseveramos
na vida. A morte é demasiada exata, todas as razões
encontram-se de seu lado. Misteriosa apara
nossos instintos, delineia-se, ante nossa reflexão,
límpida, sem prestígios e sem falsos atrativos
do desconhecimento. De tanto acumular mistérios nulos
e monopolizar o sentido, a vida inspira mais
pavor do que a morte: é ela a grande desconhecida.
(Emile Cioran, p. 22-23. 2011).


As manifestações sobre a morte e morrer entre outras ocorrências derivadas dos estados fúnebres – luto, dor, tristeza e melancolia – são instâncias representativas distintas no desenho da paisagem. Elas vigoram na cidade desde o seu surgimento, e por sua vez, produzem uma singular atmosfera no cotidiano da cidade. Suas dimensões, em suas múltiplas complexidades físicas e metafísicas, colocam em evidência a inconformidade e a desolação que ocupa nossa humanidade diante da finitude da vida.

Paradoxalmente há de se pensar também que, em movimento inverso, as evidencias da mortalidade, podem guardar em si o vigor da inventividade, da pluralidade do gênio humano. A presença da morte e do morrer na cidade criar ambiências, artefatos e toda uma cultura material que, na sua essência, produzem espaços, fabricam objetos, criam lugares. Em cada instância que se materializa na imagem da cidade, surgem numerosas simbologias que, entre outras coisas, estabelecem elos de memórias, fomentam sacralidades, aguçam o desejo de celebração, evocam um sentido honra, reconhecimento de orgulho. O resgate dessas reminiscências podem também favorecer o cultivo de sentimentos relacionados à repulsa por vidas ou ideários que promoveram a dor, provocaram guerras, deliberadamente autorizaram atos de desumanidade. Seja qual for o impacto ou atravessamento que a morte e o morrer potencializa, cada um deles formam um palimpsesto que ao longo do tempo criam distintas características na paisagem.

Ao considerar o tecido urbano contemporâneo a partir dos domínios que representam a finitude da vida, o binômio morte e estados fúnebres favorece a construção de ambientes e de uma cultura material nos quais o vácuo deflagrado pela morte é materializado nas paisagens, em diferentes ordens e sentidos que, por sua vez, adquirem forma e conteúdo, conferindo movimento à cidade.

A perspectiva em si, interposta à construção de paisagens interpretadas por essa  reflexão como fúnebres, consubstanciam-se em espaços nos quais o inanimado, o silêncio, o desaparecimento, o sombrio e o fantasmagórico alcançam potência e proeminência no desenho da arquitetura de lugares como cemitérios, monumentos in memorian; ambientes esses em que as manifestações de contrição, pesar, desolação e repulsa estão presentes e revelam limites bem definidos aos vivos quando a questão se refere ao fim da existência do outro e de si próprio.

A sociedade contemporânea continuará a conviver com a morte e esse é um fato concreto e irrefutável. Contudo, em certa medida surgem movimentos que buscam aparentemente restringir a morte – ou distintas representações que estejam a ela atrelada – a locais sagrados ou dedicados a ritos cerimoniais. Todavia, a morte se mostra presente em hábitos urbanos, de modo sutil ou espetacular, através de diálogos silenciosos de enlutados que velam seus defuntos em igrejas, capelas cemiteriais ou por meio da comunicação promovida pelo cyberespaço, amplificada ainda pelas redes sociais e sites de notícias que compartilham informações de catástrofes, acidentes fatais, atentados terroristas. Nessa ordem de fatos e narrativas, a proposta do Tópico Especial Arte Cidade – Paisagens Fúnebres, selecionará distintas fronteiras que, historicamente, a sociedade traçou para se relacionar com seus mortos, no interesse de entender as dimensões simbólicas de como morte e morrer, quando representados pelas artes visuais em seu campo ampliado, podem ser interpretados pela sociedade na cidade em movimento.

Diante disso, a produção da cultura material e seus artefatos, os ritos e dogmas religiosos, em especial as obras de arte e tudo aquilo que ganha visualidade na paisagem, tornam-se elementos essenciais para serem analisados e colocados em perspectiva ao longo curso.

Sessões de Aula

Sessões de AulaDiasRecortes Temáticos
MARÇO
I27a) Apresentação da disciplina
B) Metodologia de Abordagens
c) Conteúdo programático
D) Proposta de trabalho final:
Caderno A finitude da vida e as visualidades das paisagens fúnebres

e) Notas Introdutórias:
A morte, os cotidianos e as paisagens fúnebres - Parte I
ABRIL
II03A morte, os cotidianos e as paisagens fúnebres - Parte II
BECKER, Ernest. A negação da morte: uma abordagem psicológica sobre a finitude humana. São Paulo: Record, 2007. [O terror da morte, p. 31-46].

BARTHES. Roland. Diário de luto: 26 de outubro de 1977- 15 de setembro de 1979. São Paulo: Martins Fontes. [p. 7-25].

III10A morte é o outro
SCHUMACHER, Bernard N. Confrontos com a morte: a filosofia contemporânea e a questão da morte. São Paulo: Loyola, 2009. [Introdução, p. 15-25; Definição e natureza da morte, p. 29-51].

SÊNECA. Sobre a brevidade da vida. São Paulo: L&PM. [p. 25-37].

Filme: O Sétimo Selo (Det Sjunde Inseglet). Direção: Ingmar Bergman. Max von Sydow, Bibi Andersson, Bengt Ekerot, Gunnar Björnstrand. Suiça, 1959.
IV17A finitude da vida e as atitudes perante a morte
SCHOPENHAUER, Arthur. As dores do mundo. São Paulo: Edipro, 2016. [A morte, p. 250-293].

HAN, Byung-Chul. Morte e alteridade. Pertópolis: Vozes, 2020. [Intriga da sobrevivência, p. 31-67].

ELIAS, Norbert. A solidão dos moribundos. Rio de Janeiro: Zahar, 2011. [p. 7-49].
V24A morte, o morrer e suas manifestações nas paisagens fúnebres - Parte I
Preleção Igor Dias
MAIO
VI08A morte, o morrer e suas manifestações nas paisagens fúnebres - Parte III
LAVELLE, Louis. O mal e o sofrimento. São Paulo: É Realizações, 2014. [O mal, p. 41-64; O sofrimento; p. 65-87].

SCHOPENHAUER, Arthur. Sobre a morte: pensamentos e conclusões sobre as últimas coisas. São Paulo: Martins Fontes, 2013. [p. 3-29].
VII15Arquitetura cemiterial e arte fúnebre: territórios dos mortos e dos vivos - Parte I
LAUWERS, Michel. O nascimento do Cemitério. São Paulo: UNICAMP, 2015. [Terra dos mortos, terra sagrada, p.145-183]

ARIÉS, Philippe. O homem diante da morte. São Paulo: UNESP, 2013. [Os modelos dos futuros cemitérios, p. 671-689].
VIII22A dança da morte, inferno, purgatório, paraíso: referências medievais e renascentista
HUIZINGA, Johan. O outono na idade média. São Paulo: Cosac naify, 2011. [A imagem da morte, p. 211-245].

VAZ, Lucio. A simulação da morte. São Paulo: Perspectiva, [Possíveis influencias da cultura medieval e renascentista, p. 77 – 87].
IX29Arquitetura cemiterial e arte fúnebre: territórios dos mortos e dos vivos - Parte II
KHLLERHEAR, Allan. Uma história social do morrer. São Paulo: UNESP, 2007. [O nascimento da boa morte, p. 131-164].

RODRIGUES, José Carlos, Tabu da morte. Rio de Janeiro: FioCruz, 2011. [Imagem da morte, imagem da sociedade, p. 67-74; Morte e comunicação, p. 75-84].
JUNHO
Protocolos da morte e do morrer: o silêncio, o mal estar e o jugo dos rituais
X05VOVELLE, Michel. As almas do purgatório ou o trabalho de luto. São Paulo: UNESP, 2011. [O receptáculo dos mortos, p. 25-60].

HAN, Byung-Chul. Morte e alteridade. Petrópolis: Vozes, 2020. [Morte e finitude. A -Solidão p. 173-199; B - Eros, p. 200-231; E - Refereinidade e serenidade, p. 294-320].

Filme: Mãe! (Mother!). Direção: Darren Aronofsky, Roteiro: Darren Aronofsky. Jennifer Lawrence, Javier Bardem, Michelle Pfeiffer e Ed Harris. EUA, 2017.
Monumentos In Memoriam: museus e lugares de memória I
Prof. Jackeline Macedo
XI12Protocolos da morte e do morrer: o silêncio, o mal estar e o jugo dos rituais II
VOVELLE, Michel. As almas do purgatório ou o trabalho de luto. São Paulo: Unesp, 2011. [Do século XIX ao Século XX: metamorfose e morte no cemitério, p. 209-320].

TUAN, Yi-Fi. Paisagens do Medo. São Paulo: UNESP, 2005. [Medo da natureza humana: bruxas, p. 167-178; Medo da natureza humana: fantasmas, p. 179-206].

POE, Edgar. Contos de imaginação e mistério. São Paulo: Tordesilhas, 2012. [O enterro prematuro, p. 151-166].

Filme: A Bruxa (The Witch). Direção: Robert Eggers. Anya Taylor-Joy, Ralph Ineson, Kate Dickie. EUA, 2016.
XI19Necropolítica, arte e os lugares fúnebres na contemporaneidade I
Preleção: Igor Dias
26SEMINÁRIOS
XII

Referências

ARIÉS, Philippe. O homem diante da morte. São Paulo: UNESP, 2013.
ARIÉS, Philippe. Histótia da morte no ocidente. São Paulo: Saraiva, 2012.
BAUMAN, Zygmunt. Confiança e medo na cidade. Rio de Janeiro: Zahar, 2009.
DAVIS, Mike. Cidades Mortas. São Paulo:  Record, 2002.
BOBBIO. Norberto. Elogio da serenidade e outros escritos morais. São Paulo: UNESP, 2011.
ELIAS, Norbert. A solidão dos moribundos. Rio de Janeiro: Zahar, 2001.
FERREIRA, J. M. Simões. Arquitectura para a morte – a questão cemiterial e seus reflexos na teoria da arquitetura. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2009.
HAN, Byung-Chul. Morte e alteridade. Petrópolis: Vozes, 2020.
HUIZINGA, Johan. O outono na idade média. São Paulo: Cosac Naify, 2011.
KULKA, Otto Dov. Paisagens da metrópole da morte – reflexões sobre a memória e a imaginação
KHLLERHEAR, Allan. Uma história social do morrer. São Paulo: UNESP, 2007.
LAVELLE, Louis. O mal e o sofrimento. São Paulo: É Realizações, 2014.
LAUWERS, Michel. O nascimento do Cemitério. São Paulo: UNICAMP, 2015.
MBENBE, Achille. Necropolítica. São Paulo: n-1 Edições, 2018. POE, Edgar. Contos de imaginação e mistério. São Paulo: Tordesilhas, 2012.
RODRIGUES, José Carlos, Tabu da morte. Rio de Janeiro: FioCruz, 2011.
SCHOPENHAUER, Arthur. Sobre a morte: pensamentos e conclusões sobre as últimas coisas. São Paulo: Martins Fontes, 2013.
______. As dores do mundo. São Paulo: Edipro, 2016.
TUAN, Yi-Fi. Paisagens do Medo. São Paulo: UNESP, 2005. SÊNECA. Sobre a brevidade da vida. São Paulo: L&PM.
VAZ, Lucio. A simulação da morte. São Paulo: Perspectiva, 2011.
VOVELLE, Michel. As almas do purgatório ou o trabalho de luto. São Paulo: UNESP, 2011.
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