Exposição | A porra da arte/The Fucking Art



Os espelhos são usados para ver o rosto;
a arte para ver a alma.

Bernard Shaw

Nada nos une mais que a arte, essa mesma que nos convoca à introspecção, que nos faz ver para além da fragilidade da vida, da frugalidade do cotidiano, e que é capaz de nos fazer únicos no planeta. Nossa distinção (de Homo Sapiens) vem dessa capacidade de criar, de inventar, imaginar o impossível e construí-lo num acordo tácito entre nossas atividades recreativas, indagar o possível e constituí-lo de mistérios, por outro lado. É por essas razões que muitos temem a porra da arte. Ela vai tocar não feridas, mas falácias, vai expor antes mentiras que verdades. Não é campo aberto para plantio de sementes domesticadas, ao contrário, é terreno árido onde nascem, crescem e dão frutos somente as ideias mais vívidas. Aquele que busca na arte remanso é ingênuo, não percebe por onde vão suas raízes, engana-se de boa-fé, talvez, porque arte é espinho nos dedos dos tolos, espada nas mãos dos aguerridos.

Temos hoje, em nossa cena cultural, um claro desejo de morte da cultura, uma tanatofilia artística que extrapola os limites do respeito pelo outro com ataques sórdidos, em que verificamos postulados invejosos, mesquinhos, no nível da mera incompetência pessoal ressentida do sucesso e reconhecimento alheios. O que era para ser meio de catarse (como apregoariam os gregos da antiguidade), purgação do que é bizarro na natureza humana, e que tende a degradá-la, é renegado em sua essência como perversão, prática abominável àqueles cujos antolhos não permitem enxergar o outro, ao lado, o todo, a completude do ser. Parafraseando certo politicastro mítico seguido por essa turba, “o interesse na cultura não é no artista, nem na porra da arte”.

E o que será, então?

Uma pequena amostra disso está reunida nesta exposição em que artistas dispõem suas percepções e cognições da vida (em sociedade) à descoberta do espectador, aos critérios do diálogo, ao desejo de ampliar a rede do encontro. É esse desejo, pragmático, que leva o artista aos lugares mais improváveis porque sabe que lhe é indiferente, hoje, o local, a circunstância, o que conta é se reinventar no tempo e no espaço, porta-voz de uma época que se fará ecoar, em suas criações, como cartas para o futuro, lembretes, lembranças, avisos. O que interessa, de fato, é saber por andamos, para saber para onde vamos.


Osvaldo Carvalho


Mirrors are used to see the face;
art to see the soul.
Bernard Shaw

Nothing unites us more than art, the art that calls us to introspection, which makes us see beyond the fragility of life, the frugality of everyday life, and which is capable of making us unique on the planet. Our distinction (as Homo Sapiens) comes from this ability to create, invent, imagine the impossible, and build it into a tacit agreement between our recreational activities, to inquire into the possible, and to make it mysteries, on the other hand. It is for these reasons that many fear the fucking art.  She will touch not wounds, but fallacies, will expose lies rather than truths. It is not an open field for domesticated seed planting; on the contrary, it is arid land where only the most vivid ideas are born, grow and bear fruit. He who seeks backwater art is naive, does not understand where his roots go, makes a good faith mistake, perhaps, because art is thorn in the fingers of fools, sword in the hands of the darings.

In our cultural scene today we have a clear desire for culture to die, an artistic thanatophilia that goes beyond the limits of respect for the other with nasty attacks, in which we find envious, petty postulates at the level of mere resentful personal incompetence of success and recognition of others. What was meant to be a means of catharsis (as the ancient Greeks would claim), a purge of what is bizarre in human nature, and which tends to degrade it, is renounced in its essence as perversion, an abominable practice to those whose blinkers do not allow to see the other side, the whole, the completeness of being. To paraphrase a certain mythical carpetbagger followed by this rabble, “the interest in culture is not in the artist, nor in the fucking art.”

And what will it be then?

A small sample of this is gathered in this exhibition in which artists dispose their perceptions and cognitions of life (in society) to the spectator’s discovery, the criteria of dialogue, the desire to broaden the network of the encounter. It is this pragmatic desire that drives the artist to the most unlikely places because he knows that he is indifferent to him today, the place, the circumstance, what matters is reinventing himself in time and space, a spokesman for a time to come, echo, in your creations, as letters for the future, reminders, memories, warnings. What matters, in fact, is knowing how we walk, to know where we are going.


Osvaldo Carvalho
Versão | Aldones Nino

Local | Data

Local | Glicerina Café e galeria
Rua General Glicério, 445 – Loja C – Laranjeiras – Rio de Janeiro

Datas
Abertura | 27 de novembro de 2019 | 19 horas
Visitação | Terça a sábado: 12h00 às 00h00 – Domingo:  12h00 às 20h00

Curadoria | Osvaldo Carvalho

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